7 de jul. de 2011

Barulho demais por Battisti

Por Paulo Moreira Leite

Confesso que ando irritado com o esforço de uma fatia da mídia brasileira para criar um pequeno escandalo em torno do escritor Antonio Tabucchi, que recusou um convite para apresentar-se na Flip com o argumento de que não poderia vir ao Brasil depois que o Supremo Tribunal Federal recusou o pedido de extradição de Cesare Battisti, condenado por quatro assasinatos na Italia durante o período do terrorismo político.
Pergunto se Tabucchi demonstrou a mesma agressividade contra um governo estrangeiro quando Cesare Battisti residia na França de François Miterrand, presidente que abriu o país para militantes de várias organizações de esquerda, européias e latino-americanas, que podiam ali residir sem serem incomodados. Duvido.
Quem lê este blogue sabe qual é minha visão sobre o caso. Acho que o pedido de extradição de Battisti colocou o país diante de uma situação extrema, na qual ninguém pode ter argumentos 100% claros e inquestionáveis. A prova é que o próprio Supremo sempre se dividiu nas diversas ocasiões em que foi chamado a se prounciar sobre o assunto.
Os argumentos a favor da permanencia de Battisti são vários. Pelas leis brasileiras, os crimes pelos quais ele foi condenado podem ser considerados crimes políticos. Nossa constituição impede extradição em caso de crime político. Outro ponto é que, pelas leis brasileiras, a decisão de rejeitar ou não o pedido de extradição é uma decisão soberana do presidente da República — e o presidente Lula sempre deixou claro que era favorável a permanencia de Battisti. Não custa recordar que o Brasil tem uma longa tradição de asilo, que beneficiou várias personalidades conhecidas, como o ditador paraguaio Alfredo Stroessner, que não fugiu da prisão da estabelecer-se do Brasil– fugiu inclusive de um possível julgamento, o que é infinitamente mais grave.

Os argumentos favoráveis a extradição também pode ser considerados. Não se deve levar à serio uma postura mercantil, de quem levantou o fantasma de retaliações economicas como argumento para devolver Battisti a seu país de origem. Nós sabemos que nem todo mundo tem uma visão adequada dos direitos humanos mas não convém transformar o assunto numa barganha entre produtos de exportação e importação. (E inútil, também. Só quem desconhece a realidade do comércio entre os dois países pode imaginar que os italianos tem algum interesse em criar dificuldades para o comércio com o Brasil. A situação é oposta).
Mas é inegável que Battisti foi condenado em vários tribunais, na Italia e na Corte Européia. Outro aspecto é que determinados crimes pelos quais foi condenado foram especialmente brutais.
Embora qualquer cidadão tenha o direito de questionar se ele teve direito a um julgamento justo, ou não, não cabe ao governo de um país como o Brasil colocar em dúvida a legitimidade das decisões da Justiça de um país como a Italia.
Digo isso para lembrar o seguinte. Como a Italia, e como a França, o Brasil é uma democracia, onde os governos são eleitos pelo voto popular e tem direito de expressar pontos de vista diferentes. A mesma França que assegurou a liberdade para Battisti decidiu mandá-lo para a prisão no governo seguinte, do conservador Jaques Chirac, o que demonstra que trata-se de um caso complicado, com vários angulos que podem ser abordados e considerados.
Trabucchi escreveu um artigo com o título:  “O meu não ao Brasil de Battisti”. Não é assim, vamos combinar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário