22 de out. de 2010

Prós e contras da neutralidade

Do Jornal Cruzeiro do Sul


Notícia publicada na edição de 19/10/2010 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 3 do caderno A - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.

A independência formal do PV já era esperada, em respeito aos eleitores que acreditaram em Marina como alternativa real para as opções apresentadas ao país
A opção do Partido Verde pela neutralidade no segundo turno é, antes de tudo, uma vitória pessoal de Marina Silva, costurada previamente na reunião com a executiva nacional do partido, na quarta-feira, 13/10, em São Paulo.
Marina usou o peso de seus 20 milhões de votos para conseguir que a imparcialidade prevalecesse como posição oficial do PV, contra a vontade de lideranças como Fernando Gabeira, que não escondia sua predileção pelo apoio a José Serra (PSDB).
Gabeira e Alfredo Sirkis, presidente do PV fluminense, protagonizaram uma das alianças mais insólitas do primeiro turno, com o PSDB, DEM e PPS. Candidato ao governo do Rio, Gabeira teve um tucano (Márcio Fortes) como vice na chapa e, embora oficialmente trabalhasse pela eleição de Marina, foi considerado um dos aliados de Serra mais produtivos no Estado.
No primeiro turno eleitoral, o PV manteve acordos regionais com o PSDB, DEM ou PPS em sete Estados, e com o PT em cinco. Nos três maiores colégios eleitorais (Minas, São Paulo e Rio), o partido está mais próximo dos peessedebistas, razão pela qual o apoio a Serra era tido como certo por setores do PV e observadores externos.
Exatamente por isso, do ponto de vista dos candidatos envolvidos na corrida presidencial, talvez a opção pela neutralidade tenha decepcionado mais José Serra. Mas tanto ele quanto Dilma não têm de que reclamar: afinal, se é ruim não poder contar com o apoio de Marina e do PV, ao menos serve como consolo a constatação de tanto o partido quanto ela, pessoalmente - e ela, pessoalmente, tem muito mais força do que a sigla que representa - também não apoiarão o adversário.
Em amplo sentido, entretanto, a neutralidade é apenas retórica, e se aplica unicamente à agremiação partidária, já que os militantes foram liberados para, enquanto cidadãos e sem usar o nome do partido, declarar apoio conforme sua preferência pessoal.
Marina, acredita-se, será uma das poucas figuras de proa do PV que preferirão manter-se efetivamente neutras. É tido como certo - entre outros - o engajamento de lideranças regionais como Zequinha Sarney (Maranhão) e Gilberto Gil (Bahia) na candidatura Dilma, além do já citado Gabeira e José Luiz Penna, presidente nacional do PV e deputado federal eleito por SP, na candidatura Serra.
A independência formal do PV já era esperada, em respeito aos eleitores que acreditaram em Marina como alternativa real para as opções “conservadoras” (na definição da ex-candidata) apresentadas ao país. Presumiu-se que especialmente os jovens simpáticos à “terceira via” ambientalista ficariam chocados na hipótese de um engajamento de Marina no segundo turno.
Mas a opção pela neutralidade também tem seu lado negativo, que é a possibilidade de os eleitores mais politizados de Marina - e menos puristas, por assim dizer - interpretarem o distanciamento verde como omissão, falta de opinião ou uma forma conveniente de lavar as mãos. Nesse universo repleto de paradoxos da política, nem sempre o isolamento é a melhor alternativa, até porque a ausência de uma posição definida não deixa de ser, de forma sutil porém sensível, uma posição.
Sobre isso, é interessante notar que a última pesquisa DataFolha sobre intenções de voto mostrou que apenas 12% dos eleitores se declaram indefinidos. Isso indica que a esmagadora maioria dos 19,33% que votaram em Marina no primeiro turno já tomaram partido de Dilma ou de Serra - e talvez sonhassem com a possibilidade de ver sua candidata fazendo o mesmo.
Marina, de toda forma, preserva intocada sua imagem para 2014, o que pode ser bom ou ruim, dependendo da forma que ela utilizar seu capital político e das circunstâncias do novo governo, que tanto podem valorizá-la quanto ofuscá-la, pela absorção (a esta altura, até previsível) de suas principais propostas. Quatro anos é muito tempo.

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