18 de out. de 2010

A história do Mundo IV

Por David Coimbra

Dos hunos brancos a Angelina Jolie

Sexo é coisa de homem. O que não significa que algumas mulheres não pratiquem o esporte por puro diletantismo. A História esfervilha de exemplos de fêmeas deste quilate. Catarina, “a Grande”, imperatriz de todas as Rússias, era uma. Dizia que precisava cometer sexo pelo menos seis vezes ao dia, senão ficava nervosa. Ninguém queria deixar a czarina nervosa, então os súditos a atendiam com fervor e faziam sexo com ela.
E faziam.
E faziam.
E faziam.
Talvez fosse por isso que a chamavam de “a Grande”.
Outro exemplo cintilante é a greco-egípcia Cleópatra VII, apelidada com carinho de “Cheilon”, que em grego significa “lábios grossos”. Tinha-os grossos e sabia como usá-los, donde o seu prestígio com os romanos poderosos, como Júlio César e Marco Antônio.

O curioso é que a relação não era bem conceituada na velha Roma dos saiotes para legionários. Do ponto de vista de quem praticava, ressalte-se. Quem recebia, gostava, como se constata pela paixão que Júlio e Marco devotaram à rainha, bem como outras centenas (centenas!) de romanos, egípcios, gregos e núbios altos, fortes e espadaúdos que tiveram a sorte de experimentar um pouco das artes labiais da nossa heroína.
A verdade é que práticas sexuais, como quase tudo na vida, mudam de acordo com a cultura. Isso do sexo oral. Os índios brasileiros não o conheciam. Não conheciam nem beijo na boca, e assim os portugueses, beijoqueiros dedicados, eles com seus sonetos melosos de amor é fogo que arde sem se ver e talicoisa, os portugueses fizeram vasto sucesso entre as nossas silvícolas com o cheiro do cravo e a cor da canela, quando aqui chegaram em suas caravelas.
Você sabe, mulher valoriza muito o beijo na boca, assim como valoriza os sapatos de um homem. Quando uma mulher vê um homem pela primeira vez, ela o avalia pelos sapatos que calça. Digamos numa balada: o homem chega e…
Mas estou tergiversando. Voltemos ao sexo oral.
No Brasil de meados do século, o homem que praticava sexo oral era malvisto pelos outros homens, embora seja provável que as mulheres não pensassem o mesmo. Os conhecidos apontavam-no na rua e diziam:
- Aquele lá é mineteiro.
Mineteiro vem de “mina”. A mina, no caso, é associada com o órgão sexual feminino. Não porque de lá sai ouro. Por causa das formas de uma e outra, entende? Bom. Não serei mais explícito.
Em Portugal essa palavra ainda é bastante empregada. Você já sabe como são esses portugueses… Não é à toa que as nossas índias… Mas estou fugindo do assunto novamente. O que importa, agora, são as mulheres da História que exerciam o sexo tão-somente pelo prazer e pela diversão. De todas, a minha preferida é Messalina.
Ah, Messalina, Messalina… Era uma loirinha magrinha e formosa. Posso imaginá-la, sim, senhor. Pequena, mas com pernas longas, ela toda longilínea. O cabelo dourado, a pele dourada, os lábios carnudos ansiando por serem beijados e mordiscados e para beijar e mordiscar. Mordisque-me, Messalina!
Messalina, sim, senhor.
Tinha tal ânsia por sexo, Messalininha, que, à noite, metia-se debaixo de uma peruca morena e esgueirava-se para a Suburra, o bairro do pecado de Roma. Lá, subia em um tamborete e oferecia-se aos transeuntes por poucos sestércios. Aceitava qualquer um por qualquer preço. Levava-o para um dos quartos infectos que os rufiões alugavam e, sobre um catre precário, conduzia-o ao Olimpo. Viveu apenas 22 anos, Messalina, o suficiente para transformar o marido, o imperador Claudius, no maior corno da História da Humanidade, com a provável exceção de um vizinho que tive, um dia ainda conto a história dele.
Transformou-se também, Messalina, em sinônimo de devassidão. Se alguém quer falar mal de uma senhora, classifica-a:
- É uma Messalina.
Todo mundo faz ó.
Já eu considero um elogio. Messalina sabia das coisas. Algumas mulheres sabem. Mas só algumas. Para a maioria, o sexo pode ser bom e tudo mais, mas é secundário. O mais importante para elas é o que há de mais importante na vida: a reprodução.
Isso torna difícil, para um homem, compreender o funcionamento da alma das mulheres.
Um homem passa a maior parte do tempo pensando em sexo.
O sexo é o eixo da sua existência. O que nos torna, a nós homens, uns iludidos. Porque o sexo é aventura, e nós acreditamos na aventura. Acreditamos que podemos sorver a glória da vida. As mulheres não acreditam em nada disso, porque elas sabem que não existe glória na vida.
Que tipo de animal é o homem? É um pavão tentando impressionar a fêmea. O que ele faz, se não dispõe de um penacho colorido na cauda? Ele ostenta a sua riqueza, ou o seu poder, ou a sua fama, ou a sua força física, ou os versos harmônicos de um soneto, aquela história do amor é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói e não se sente, é um contentamento descontente, é dor que desatina sem doer. Esses portugueses…
O homem passa a vida tentando conquistar a mulher. Ou as mulheres. Seu comportamento muda de acordo com a oferta de sexo. Agora mesmo assiste-se a um curioso debate no século 21: a respeito dos filhos que não saem da casa dos pais nem depois de adultos. Homens com 40 anos de idade ainda homiziados em seus quartos de menino. Analistas alegam tratar-se de uma consequência das mazelas econômicas do mundo moderno. A vida está mais difícil de ser ganha, o emprego mais escasso, então os homens preferem ficar no lar paterno a fim de gastar menos e bibibi.
Balela.
Eles não saem de casa por causa do sexo. Porque o sexo, agora, é mais fácil de ser obtido. Antes, um homem, para conseguir sexo, tinha necessariamente de levar sua própria vida, apartada dos pais. Tinha de morar no seu apartamento, de poder chegar em casa quando bem lhe aprouvesse, sem a vigilância de pai e mãe. Ou seja: ele tinha de sair da casa dos pais.
Hoje não é preciso mais nada disso. Hoje os filhos mandam em sua própria vida, mesmo que morem com a família. Hoje eles chegam em casa quando querem, saem quando querem e, sobretudo, levam quem quiserem para seus quartos. Um rapagão, hoje, chega ao apartamento do pai acompanhado de uma loira vestida com jeans justo e mascando chiclé, apresenta-a perfunctoriamente, “essa é a Lu, velho”, e a conduz pela mão para o seu quarto, onde eles passarão três horas jogando moinho ou escova. Dispondo desta alegre possibilidade, por que o nosso rapagão iria alugar um JK na Zona Norte? Ele não precisa. Na casa dos pais ele tem tudo o que quer, sem ter que pagar.
O sexo, pois, comanda as ações do macho. Da mulher não.
A mulher, o que a comanda é a reprodução da espécie. Não duvido que neste momento você se lembre da sua colega que vem trabalhar com aquelas roupinhas e que olha para os homens de um jeito blasé que parece urrar: “Eu quero sexo, garoto!”. Sim, eu sei que você vai se lembrar dela e vai argumentar: “Luaninha gosta de sexo como se fosse um homem”.
Mas você está enganado.
É tudo um truque de Luaninha. Em sua maioria, as mulheres usam a premência masculina pelo sexo para alcançar seus objetivos. Nem que os objetivos sejam, apenas, de medir a extensão de seu poder. É o caso da mulher que acena com promessas e depois recua. Ela queria, mas desistiu? Não. Ela nunca quis. Ela só pretendia constatar até onde poderia levá-lo, a você e a essa sua infantil agonia sexual.
Veja uma mulher jovem, fresca, tenra, linda e de minissaia e botas, como deveriam se vestir todas as mulheres jovens, frescas, tenras e lindas. Ela é como a flor colorida e cheirosa que atrai a abelha com o objetivo de ser polinizada. As mulheres são como plantas, também querem ser polinizadas. Querem se reproduzir. Vou dar dois exemplos separados em 1.500 anos para que você possa compreender melhor o que digo.
O primeiro: Teodora, a imperatriz de Bizâncio.
Antes de ser imperatriz, Teodora foi prostituta. Ao contrário de Messalina, que, antes de ser prostituta, foi imperatriz. Isso diz muito sobre uma e outra. Messalina prostituiu-se por gosto, Teodora por necessidade. Mesmo assim, Teodora era uma prostituta competente. Aprendeu alguns truques para agradar os homens (sim, garota, algumas mulheres conhecem certos truques), tornou-se célebre em Constantinopla e, numa noite feliz, acabou se instalando no leito do imperador Justiniano. Feliz para ela e feliz para Justiniano, bem entendido. Tanto que o imperador se apaixonou por ela, apartou-a da vida fácil, transformou-a em teúda e manteúda e, depois, em imperatriz.
Você pode achar que, empossada imperatriz, aí sim que Teodora se soltou e passou a cevar seus desejos mais recônditos. Se achou, achou errado. Teodora foi uma imperatriz concentrada quase que com exclusividade nas lides políticas. Fez de tudo para conservar e aumentar o seu poder. E fez bem: certa feita, salvou a coroa do marido durante a chamada Revolta Nika. Ou Revolta Nike, que, em grego, significa “vitória” e, em português, significa marca de calção de índio. Vou discorrer mais alentadamente sobre Teodora no capítulo apropriado, o da Alta Idade Média, um tempo aborrecido de se viver, mas divertido de se contar. Por ora, ressalto apenas o aspecto que queria ressaltar: que Teodora usou o sexo para atingir o seu objetivo político.
Muitas mulheres são assim.
Outras são como Angelina Jolie. Você se lembra da Angelina Jolie no começo da carreira? Ela exsudava sexo. Dizia que lhe apetecia refestelar-se com homens, mulheres e outros seres mais ou menos parecidos. Expunha aquelas tatuagens dela. Usava umas roupas que faziam a gente sentir uma dor bem aqui. No peito, digo.
Aí Angelina conquistou Brad. E o que aconteceu? Ela começou a ter filhos. Quantos, exatamente, não sei. Talvez nem Brad saiba. Mas são vários. Alguns o próprio Brad proporcionou. Um se chama Maddox, veja só. Outros ela adotou. Africanos, quase todos. O Brad dá uma saidinha para beber um chope cremoso com os amigos e, quando volta, tem um etiopezinho novo. Brabeza.
O fato é que Angelina mudou. Continua linda e continua com aquela boca, mas perdeu muito da sua ferocidade sexual. Por quê? Porque não precisa mais dela. Seu objetivo, que era ser mãe, demasiado mãe, já foi alcançado.
Assim se comporta a maioria das mulheres em relação ao sexo. Com pragmatismo. Elas encaram o sexo como um meio, não como um fim.
Elas conhecem a verdade da vida.
Bem cedo desenvolvem tal percepção, já na pré-adolescência. Graças à menstruação.Com 12 ou 13 anos de idade a menina compreende que a vida tem ciclos, que tudo germina, floresce e fenece, que tudo nasce, chega ao auge e morre. Este ciclo está dentro dela, ocorre todos os meses. A menina logo entende, portanto, que nós não somos imortais.
O homem, ao contrário. O homem passa a vida julgando-se imortal e acreditando que algo de extraordinário acontecerá logo adiante. Que vai alcançar a glória, a fortuna, o sucesso. É por isso que o homem se ilude trocando de mulheres, buscando vida nova.
As mulheres não se iludem. As mulheres são práticas, os homens são românticos.
Essa qualidade das mulheres fez com que elas aceitassem a monogamia que lhes foi imposta na alvorada da Civilização. Para elas era até bom. Porque, com a monogamia, o homem assumia compromissos até então inéditos para com ela e com os filhos. Com a monogamia, fundou-se a família. A mulher, agora, dispunha de ajuda na tarefa de criar os filhos. Dispunha de uma casa, não precisava mudar-se a todo o momento, o que era um incômodo para quem tinha de levar a criançada junto. Com a casa, a mulher passou a dispor de instrumentos, ferramentas, confortos impensáveis para quem leva a vida nômade.
A vida da mulher melhorou, pois, e por isso ela aceitou sua condição presumidamente inferior durante milênios, mesmo que, no passado, gozasse de grande prestígio devido ao seu papel na reprodução.
Gozava mesmo.
As divindades eram femininas. Os homens pediam proteção à Grande Mãe. As primeiras esculturas da Humanidade são, exatamente, de mulheres grávidas. É quase certo que serviam para algum tipo de culto ancestral. Ou seja: a mulher grávida era adorada como uma deusa.
Mesmo depois de descoberta a participação do homem na reprodução e de instaurada a Civilização, mesmo depois de erguidas as primeiras cidades, as deusas seguiram sendo veneradas. Vide Ishtar, dos babilônios, e Ísis, dos egípcios.
Não que as comunidades fossem matriarcais. Não eram. O mando manteve-se em poder do homem porque era o homem que fazia a guerra.
Eis um sarcasmo histórico que pode excitar as feministas mais arrebatadas: a mulher tinha prestígio por dar a vida, o homem por trazer a morte.
Com certa razão. Não é tarefa fácil matar pessoas em massa. É preciso organização e método. É preciso pla-ne-ja-men-to. Generais eram precisos. Esses generais da antiguidade montavam defesas, preparavam estratégias de ataque, mostravam a cada integrante da tribo o que fazer e, não raro, quando a luta terminava, continuavam com o poder enfeixado em suas mãos rubras de sangue humano. É assim que funciona.
Permita-me agora, paciente leitor, uma rápida digressão para ilustrar o tema e para falar de alguns dos personagens mais misteriosos da História do Mundo: os hunos brancos. Os hunos brancos, como talvez você já tenha deduzido, eram hunos e eram brancos. O que parece uma obviedade, devido ao nome deles, mas não é. Porque os hunos, hunos mesmo, os súditos do rei Átila, eram da raça mongólica. Isto é: eram pequenos e retacos, tinham a pele acobreada, os olhos amendoados, os cabelos negros e as pernas cambotas como as dos vaqueiros norte-americanos. Uns e outros, vaqueiros e hunos, as possuíam arqueadas pelo mesmo motivo: por montarem a cavalo desde a infância.
Já os hunos brancos, embora se assemelhassem com os hunos de Átila nos hábitos e na região de procedência, o Oriente Longínquo, tinham a pele branca como uma Charlize Theron e os olhos claros como uma Michelle Pfeiffer. Mas não deviam ser tão bonitinhos. Os hunos brancos eram guerreiros temíveis. Hábeis cavaleiros, disparavam flechas com farpas que dilaceravam a carne do inimigo ao serem arrancadas do corpo. Aterrorizaram parte da Índia, dizimaram povoados entre os séculos 4 e 6 e depois desapareceram. Mesclaram-se a outros povos? Foram massacrados por guerreiros ainda mais ferozes? Ninguém sabe, ninguém viu.
No entanto, não é sua trajetória fugaz e enigmática que torna a história dos hunos brancos interessante, e sim o fato de que eles adotavam a poliandria.
Hein? Explico.
Vem do grego: “poli”, muitos; “andros”, homem.
Muitos homens.
Entre os hunos brancos, raridade em todas as sociedades humanas, uma única mulher casava-se com vários homens. Isso ocorria provavelmente porque havia muito mais hunos brancos do que hunas brancas. É o mecanismo de compensação biológica da Natureza. Nem essa prerrogativa, porém, concedia às mulheres o domínio político na sociedade dos hunos brancos, mas é possível que algumas delas atuassem como sacerdotisas. Os hunos brancos adoravam o sol e a lua e tinham o hábito de beber sangue de um cavalo branco em seus rituais, o que os outros povos achavam muito nojento e eu também, eu não gostaria de beber sangue de um cavalo branco.
Mas o que a história dos hunos brancos e das hunas brancas demonstra é que não existem regras fixas que norteiem o comportamento de homens e mulheres. Existem padrões. Que mudam de acordo com a geografia, o clima e a política. O homem é o homem e suas circunstâncias, como disse Ortega Y Gasset.
A história da Humanidade, pois, é cambiante. Fomos nômades durante milhões de anos, e essa condição mudou devido à agricultura, à propriedade e à consciência da participação do homem na reprodução. A mudança modificou a condição da mulher, que foi perdendo espaço na sociedade devagar, até perder bruscamente, com o advento de uma religião masculina em todas as instâncias: o judaísmo.
Com o judaísmo, a Grande Mãe deixa de existir. Com o judaísmo, Deus é Pai. O judaísmo moldou as modernas sociedades humanas. É a mais antiga religião viva do mundo. Mas, antes dela, outras vicejaram, em um mundo que, se não existe mais, deixou suas marcas.

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