12 de nov. de 2010

Empresário Português define especuladores: àqueles para quem FHC terceirizou a direção da política econômica do Brasil

Do IG
O empresário José Manuel Rodrigues Berardo é uma pessoa de muitos atributos. Considerado um dos dez homens mais ricos de Portugal, é dono de um império que inclui negócios em áreas variadas, como ração para animais, telecomunicações, vinícolas, bancos, hotéis e tabaco. A fortuna acumulada ao longo dos anos permitiu que Joe, como prefere ser chamado, se transformasse no maior colecionador de art déco do mundo. Seu acervo conta com mais de 40 mil peças, que representam os 78 movimentos culturais do século 20. Mas uma das características mais marcantes deste português de 66 anos é a língua afiada. Em entrevista exclusiva ao iG durante visita ao Brasil, disparou contra o investidor George Soros e os especuladores do mercado financeiro. “Eles têm o rei na barriga”, disse Berardo, com forte sotaque português. “Estão cometendo o maior roubo da história da humanidade, nem os portugueses fizeram coisa parecida”.
A implicância de Berardo com especuladores tem explicação. Desde 2008, viu evaporar quase metade de sua carteira de ativos (o equivalente a R$ 1,3 bilhão) por causa da crise financeira mundial. O culpado pelas perdas? O investidor George Soros. “Em 1993, ele quase levou a Inglaterra à falência depois de lucrar R$ 3,6 bilhões no mercado especulativo”, afirmou o empresário. “As pessoas viram que é possível fazer dinheiro assim”. Para explicar sua teoria, compara a atividade dos investidores a um cassino. Segundo ele, o apostador pode colocar suas fichas nas cores preta e vermelha. Se ganha, tem caixa para duplicar a aposta. O problema é quando começa a perder e, mesmo assim, aumenta continua a arriscar. “Essas pessoas não têm responsabilidade, não têm compromisso de criar empregos”, disse o empresário. “Roubam bilhões e não existe um ninguém capaz de parar isso”.

Durante algum tempo, Berardo acreditou que a eleição do presidente americano Barack Obama, no final de 2008, poderia mudar esse cenário. “Achava que ele ia dar um jeito nisso”, afirmou Berardo. A esperança, no entanto, foi embora com a suposição de que os políticos estão comprometidos com os especuladores. Ele cita como exemplo a campanha do próprio Obama, que custou pouco menos de US$ 1 bilhão. “Quem pagou a conta foram aqueles que gastaram centenas de milhões de dólares para eleger o presidente que quiseram”. Nem mesmo os casos recentes de prisões de investidores servem para acalmar os ânimos do empresário português. No início de outubro, o ex-corretor francês Jerôme Kerviel foi condenado a três anos de prisão por causar prejuízos de R$ 11,7 bilhões ao banco Société Générale. “Eles não procuram os tubarões, mas as sardinhas”, afirmou Berardo.
Quando o assunto não é economia, Berardo relaxa e fica mais bem-humorado. Fala com desenvoltura sobre qualquer coisa, mas tem dois assunto preferidos: arte e vinhos. Há uma semana, desembarcou em São Paulo pela quarta vez no ano para promover o lançamento de uma nova safra da bebida. Produzida na Quinta da Bacalhôa, uma das vinícolas instaladas em Portugal, a série limitada de mil garrafas do Berardo Reserva Familiar será vendida no País sob encomenda por cerca de R$ 1 mil. Em sua segunda edição, a bebida é resultado da combinação de uvas de três castas francesas (cabernet sauvignon, merlot e petit verdot) e duas portuguesas. “A minha mulher, que é quem aprova os vinhos da empresa, deu 100 pontos para essa safra”, afirmou Berardo. “Isso significa que é o melhor vinho que ela já bebeu até hoje”.
A infância de Berardo foi bem diferente da vida confortável que leva hoje. Nascido na Ilha da Madeira, um arquipélago com 250 mil habitantes perto da costa sudoeste do País, viu seu pai perder todas as economias da família com a falência do Banco Henrique Figueira. “Ele era um expert em contas, mas não sabia ler”, disse ao diário português Económico. Aos 13 anos, se viu obrigado a largar a escola para trabalhar e ajudar a pagar as contas de casa. Seu primeiro emprego foi na fabricante de vinhos Madeira Wine Association, que se tornaria uma das suas grandes paixões, onde era responsável por colar os rótulos das garrafas. “Naquela época era tudo feito à mão”, afirmou Berardo. Cinco anos depois, tomou uma decisão que mudaria sua vida para sempre: migrou para a África do Sul.
O início no continente africano também não foi dos mais fáceis. Sem saber o que fazer da vida, passou um tempo perdido. Aproveitou o período para aprender a falar inglês e africâner, língua oficial do país que mistura influências do holandês, francês e português. Seu primeiro trabalho na África do Sul foi numa venda de frutas e verduras em Johanesburgo. O negócio começou a crescer e ele passou a vender os produtos de hortifruti para os refeitórios das mineradoras do país. O círculo de amizades aumentou com a mesma velocidade de sua conta bancária. Foi assim que conheceu o então ministro sul-africano das Minas, para quem apresentou um plano para explorar os rejeitos produzidos pelas minas de ouro do País. Com a autorização embaixo do braço, começou a trabalhar no negócio em 1977. Três anos depois, o preço do ouro explodiu – e Joe Berardo deu início a sua fortuna pessoal.
A longa passagem pela África do Sul rendeu mais do que uma conta bancária polpuda e a mania de usar expressões em inglês no meio das frases. Foi lá que o empresário desenvolveu o gosto pelas artes. O começo, no entanto, foi marcado por uma gafe. Berardo tinha acabado de se casar com Carolina, com quem está junto há mais de 40 anos e com quem tem dois filhos, quando resolveu decorar sua casa. Entrou numa loja para comprar quadros e, depois de selecionar seus preferidos, negociou o preço e mandou embrulhar. Já em casa, foi pregar um deles na parede quando teve uma desagradável surpresa. “Compramos o nosso primeiro quadro e já fomos enganados”, disse Berardo para a mulher. “Nos venderam uma impressão”. Carolina deu risada e respondeu que, se ele quisesse comprar o original, teria de negociar com o museu do Louvre, em Paris. “Você comprou um pôster da Mona Lisa”, disse ela.
Joe Berardo conta como começou sua coleção de arte
 
De lá para cá, o acervo de Berardo mudou radicalmente. Segundo o jornal inglês Daily Mail, a coleção de mais de 40 mil peças do empresário é comparável com a do museu Guggenheim, que tem cinco unidades espalhadas pelo mundo. Não em quantidade, mas em qualidade. Entre outras coisas, Berardo é dono de dois quadros do pintor espanhol Pablo Picasso e um do russo Wassily Kandinsky. Juntas, as obras são o melhor retrato da arte do século 20. Boa parte da coleção já esteve exposta em mais de 890 museus nos quatro cantos do planeta, inclusive no Brasil, onde participou da comemoração do Ano da França no Brasil. Sobre a possibilidade de inaugurar um museu no em Barra de São João, perto de Búzios, no Rio, Berardo sorri e não confirma a informação.
Um dos orgulhos de Berardo são as réplicas de estátuas de Buda que mantém em Portugal. A ideia da coleção surgiu de forma inusitada. O empresário português assistia à televisão ao lado do filho quando viu os extremistas do Taleban destruírem as estátuas de 23 metros de altura e seis toneladas de Buda no Afeganistão. Comovido com o que considerou uma violência contra a humanidade, decidiu que viajaria para a China para encomendar o peso equivalente em estátuas do fundador da religião asiática. Depois de prontas, as peças de granito e mármore foram enviadas para a Quinta dos Loridos, uma das vinícolas de Berardo. Lá, as peças podem ser visitadas gratuitamente – até 20 mil pessoas vão ao museu por final de semana. Atitudes como essa fazem com que as pessoas tenham opiniões distintas sobre Berardo. Alguns o enxergam como um grande empresário. Outros, como um milionário excêntrico.

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