6 de nov. de 2010

Participação do Estado no longo prazo

Do blog do Nassif

Por Gunter Zibell
Eu acredito que no longo prazo prevalecerão os programas com maior participação do Estado. As eleições norte-americanas ganham muita atenção neste momento, mas, se pensarmos em processos de longo prazo parecerão com um ponto fora da curva.
O ponto principal é que o liberalismo é utópico. Leva a equilíbrios econômicos de longo prazo mas não à maximização da produção. Leva à cristalização da estratificação social, não à resolução de conflitos ou de problemas estruturais. Nunca é capaz de lidar com crises e a história ilustra isso com as ondas de crescimento do estado e/ou protecionismo:
- no final do século XIX pela necessidade de Inglaterra, França, Alemanha e EEUU protegerem seus industriais e estruturarem a colonização;
nas décadas de 30 e 40 para promover a reativação da demanda (em várias formas de regimes políticos);
- nas décadas de 60 a 80 para o desenvolvimento da Europa Ocidental, Europa Oriental, Canadá, Austrália, América Latina e Ásia vis-a-vis os EEUU (nesse período a participação dos EEUU no PIB mundial passou de quase 50% para pouco mais que 20%. As privatizações dos anos 90 são antes prova do resultado bem sucedido do desenvolvimentismo: sem ele precedendo simplesmente não teriam havido cias. aéreas, bancos, siderúrgicas, petroleiras e telefônicas);
- a partir desta década de 10 do século XXI a participação do estado nas economias voltará a crescer para lidar com o desenvolvimento ecosustentável, o envelhecimento e a batalha comercial entre economias centrais e emergentes (e novamente para recuperação da demanda agregada.)

O socialismo estrito também é utópico por seu turno, então não é de se admirar que, ainda que a história não tenha acabado (como pretendia Fukuyama), os discursos social-democrata e social-liberal, nas mais variadas nuances, ainda sejam os predominantes.
É claro que há momentos em que o estado é questionado no que se refere à sua eficiência na gestão de recursos e na capacidade de inovação. É nesses momentos, e na ausência de graves demandas sociais, que os discursos anti-estado obtêm sucesso, como um recado nas urnas de que, para um determinado estágio, o estado cresceu demais ou está ineficiente. Mas nunca se volta ao ponto anterior de minimização do estado.
Dentro da estruturação de democracias convencionais os resultados eleitorais são então cíclicos, com duração de duas a três décadas. Há um certo movimento pendular ao longo do tempo, entre “esquerda” e “direita”, mas o eixo de longo prazo é inclinado. Portanto, agora, após duas décadas de grande presença, o liberalismo parece mais para ser substituído, não ainda mais prolongado.
Assim, os EEUU não retornarão aos anos 80, muito menos aos anos 20. E os episódios atuais nos EEUU de visibilidade do Tea Party e perda da Câmara pelos Democratas estão muito mais ligados ao insucesso na saída rápida da crise de desemprego que numa crença coletiva de que o liberalismo seria solução (por mais que os norte-americanos professem seu apego a valores individualistas, sempre querem, no fim, que o estado os proteja.)
A Era Bush provou que também não há caminho por esse lado, então o mais provável é que os norte-americanos desejem agora que ambos os lados sentem juntos e trabalhem de modo mais concreto para a superação da crise. Não é por acaso que o Senado segue com maioria Democrata e que não surgiu ainda um candidato Republicano competitivo para a presidencial de 2012. E, inevitavelmente, o estado norte-americano sairá maior, pois um aumento de demanda induzida pelo estado (ao invés de injeção de liquidez ou redução de impostos) é a solução provável.
Na Europa, apesar do recente triunfo dos Conservadores no Reino Unido, as perspectivas para os próximos anos são de que a dificuldade na condução da crise econômica e da previdência levará a trocas de posição nas principais economias. O mesmo é possível para o México. Na Ásia em nenhum momento se abandonou o capitalismo de estado, diga-se.
Para o Brasil a vitória expressiva do PSDB em governos estaduais não leva a maiores esperanças para o conservadorismo, especialmente se considerarmos em conjunto o desmonte de sua bancada no Senado. Questões sociais sobrevivem mal-resolvidas, afinal o país ainda é subdesenvolvido, o que mantém as perspectivas do PT em sua maior parte. Os resultados eleitorais nos estados do Centro-sul brasileiro são em muito relacionados a um conflito redistributivo, não ideológico : tais estados ressentem-se de suas menores cotas no Fundo de Participação de Estados e Municípios; também amargam uma outra transferência regional de renda, via valorização cambial e desvalorização relativa de seus principais excedentes de produção. E, finalmente, reclamam maior presença de infraestrutura. Liberalismo ou conservadorismo não resolvem nenhuma dessas demandas (quanto ao câmbio, muito pelo contrário), tanto que não foi usado como discurso nas eleições.
A canalização da insatisfação para preconceitos pôde servir a propósitos políticos, mas só os eleitorais de curto prazo. O que vale mais é a capacidade de resolver problemas e apresentar resultados de gestão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário