Por Paulo Moreira Leite
Essa semana tivemos o acesso aos documentos produzidos durante a ditadura militar sobre a presidente eleita Dilma Rousseff, por exemplo que ela passou vinte e dois dias sob tortura e que ela seria responsável pelo armamento do grupo VAR-Palmares.
Acho que há algumas observações que temos que fazer. A primeira é que é inteiramente legítima a curiosidade e interesse pela biografia de uma personalidade Dilma Rousseff, hoje presidente eleita. É um direito que nós temos, todas as informações sobre sua atividade política presente e passada, a população que saber e tem o direito de saber. Acho esse um ponto pacifico, um ponto importante. O segundo ponto, porém, é que a gente que ver que as informações ficam melhor entendidas quando são vistas num contexto apropriado. Hoje quando se fala em armas, em assaltos a banco, em atos de violência, parece que estamos falando de uma situação de crime, quando na verdade temos colocar na situação da época em que governo foi um governo militar que tinha deposto um governo eleito, que não realizada eleições. Esse tipo de atividade mesmo que você discorde delas, que não são produtivas e eram erradas, eram na verdade atos de resistência. Esse é um dado importante e está num contexto político. Estamos falando de pessoas que assaltavam bancos, que usavam arsenais de armas para cometer crimes, mas era situação de violência reagindo de forma violenta, pode até ser errada mas é um contexto que precisa ser melhor entendido.
Esse episódio me lembra mais uma coisa interessante que é aquela tradição de que no Brasil a gente só consegue ter informação de um lado. Só conseguimos ter informação a respeito das pessoas que foram vítimas da tortura, das que resistiram ao regime. Mas até agora, ao mesmo tempo de que se abre – após a espera de alguns meses – esses documentos sobre Dilma Rousseff, há duas décadas nós esperamos pela abertura dos arquivos militares. Arquivos que dizem quem fez o que na ditadura militar, especialmente quem foram os responsáveis por crimes como a tortura,por crimes como execuções, quem deu as ordens, quem a cumpriu. Isso a gente continua sem saber.
Recentemente morreu o senador Romeu Tuma, que durante anos foi chefe do DOPS de São Paulo. Ele era um homem de ligação entre o DOPS e o serviço de informação do exército e nunca se soube direito o que ele fez. Então temos uma história pela metade. De um lado nós podemos saber, mas ao mesmo tempo de outro lado, é um silêncio, um mistério. Isso é muito ruim porque nós somos um país que ficamos com a memória quebrada, partida. Não é um país que consegue ter uma memória integral a respeito de próprio.
No Conisul esses arquivos já foram abertos. É inacreditável. A gente gosta de falar que o Brasil é um pais líder na America Latina, que somos um exemplo para os nossos vizinhos.Mas ainda não encaramos essa história com maturidade, com tranqüilidade, sem revanchismo, sem rancor, mas apurando fatos. Como é nisso que a gente explica abrindo os documentos sobre a presidente Dilma Rousseff. A gente não tem essa maturidade. Estamos atrasados.
Os nossos vizinhos abriram seus arquivos, eles já viram o que aconteceu. Em alguns casos os torturadores já estão presos e condenados. Na Argentina, o presidente Videla está cumprindo prisão perpetua. Enquanto no Brasil tenta-se apagar fatos que a gente nem sabe o que aconteceu, nem quem são os responsáveis.É muito estranha essa nossa forma de fazer história e eu acho que uma hora ela vai mudar.
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