Do JB online
Ameaçado pelos protestos que se espalham pela Líbia há cerca de uma semana, o coronel Muamar Kadafi, de 68 anos, é o líder há mais tempo no poder tanto na África quanto no mundo árabe. Ele está no comando da Líbia desde que depôs o rei Idris 1º, em 1969, em um golpe de estado sem derramamento de sangue, quando tinha 27 anos.
Conhecido por seu estilo extravagante de se vestir e pelas guarda-costas do sexo feminino, o líder líbio também é tido como um político habilidoso, que conseguiu tirar seu país do isolamento diplomático.
Em 2003 - depois de passar duas décadas sendo visto como país pária - Trípoli assumiu responsabilidade pelo atentado contra um voo da PanAm sobre a cidade escocesa de Lockerbie, em 1988, abrindo caminho para que a ONU suspendesse suas sanções contra a Líbia.
Meses depois, o regime de Kadafi abandonou os esforços para desenvolver armas de destruição em massa, o que também facilitou a aproximação com o Ocidente. Por causa das duas medidas, Khadafi deixou o isolamento e passou a ser aceito pela comunidade internacional, ainda que com ressalvas.
"Ele é único em seu discurso, em seu comportamento, em suas práticas e em sua estratégia", disse à BBC o analista de política líbia Saad Djebbar. "Mas é um politico astuto, e um sobrevivente político."
Raízes beduínas
Kadafi nasceu no deserto líbio, perto de Sirte (norte) em 1942. Em sua juventude, ele admirava o líder egípcio e nacionalista árabe Gamal Abdel Nasser.
Seus primeiros planos para derrubar a monarquia líbia começaram durante seus estudos militares, e ele recebeu treinamento militar na Grã-Bretanha antes de retornar à cidade líbia de Benghazi e iniciar ali o golpe que o levaria ao poder, em 1º de setembro de 1969.
Em seu Livro Verde, lançado nos anos 1970, Khadafi expôs sua filosofia política, apresentando uma alternativa nacional ao socialismo e ao capitalismo, combinada com aspectos do islamismo. Em 1977, ele criou o conceito de "Jamahiriya" ou "Estado das massas", em que o poder é exercido através de milhares de "comitês populares".
Khadafi gosta de prezar tradições locais em público. Quando visita outros países, acampa em uma luxuosa tenda beduína, típica dos povos de sua região. Durante as viagens, o coronel é protegido por guarda-costas mulheres - que diz serem menos dispersivas do que os homens.
O coronel também recebe políticos e personalidades que visitam o país em uma tenda beduína. Durante os encontros, ele é conhecido por se proteger das moscas com um crina de cavalo ou com um leque feito de uma folha de palmeira.
'Cachorro louco'
O ex-presidente americano Ronald Reagan chamou o líder líbio de "cachorro louco" e, em 1986, autorizou um ataque aéreo a Trípoli e a Benghazi em resposta a um ataque a bomba contra uma discoteca em Berlim Ocidental, que matou dois militares americanos e uma mulher turca e que, segundo os Estados Unidos, teria sido realizado por agentes líbios.
Os bombardeios americanos mataram 45 soldados e funcionários públicos e 15 civis. Entre estes estava uma filha adotiva de Khadafi, que teria ficado bastante abalado.
Nos anos 1990, rejeitado em seus esforços para unir o Mundo Árabe, o líder líbio se voltou para a África, propondo a criação de um país-federação no continente, nos moldes dos Estados Unidos. Para promover a ideia, ele passou a se vestir usando roupas que carregavam emblemas do continente ou retratos de líderes africanos.
Mas no fim da década, com a Líbia em dificuldades por causa das sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos, Khadafi se viu forçado a assumir a autoria do atentado de Lockerbie e de outros atentados, para lentamente restabelecer o diálogo do país com os Estados Unidos. "Não haverá mais guerras, ataques ou atos de terrorismo", disse o coronel ao celebrar 39 anos no poder.
Desafios domésticos
Em seu país, o coronel se apresenta como o guia espiritual da nação, supervisionando o que diz ser uma versão local de democracia direta.
Na prática, segundo os críticos, Khadafi mantém controle absoluto e autoritário da Líbia. Dissidências ou críticas foram duramente reprimidas e a mídia do país sempre foi rigorosamente controlada pelo governo.
A Líbia tem uma lei que proíbe atividades em grupo baseadas em ideologias políticas que sejam opostas à revolução de Khadafi.
Segundo a organização internacional Human Rights Watch, o regime prendeu centenas de pessoas por violarem a lei e sentenciou algumas à morte. Também há relatos de tortura e desaparecimentos.
No entanto, acredita-se que o coronel esteja preparando terreno para a transição, por causa de sua idade avançada, mas não está claro quem poderia sucedê-lo.
Especula-se que um de seus filhos, Saif al-Islam Khadafi, seja o principal proponente de reformas no sistema. Saif anunciou que se aposentará da política, mas as opiniões se dividem sobre se isso seria uma manobra tática para expandir seu apoio popular.
Enquanto isso, Khadafi prometeu que a maior parte dos ministérios do país será abolida e que os orçamentos destes serão entregues diretamente à população. Mas as reformas são lentas na Líbia, mesmo que a economia do país tenha sido aberta ao investimento estrangeiro. "Eles são muito cautelosos ao efetivar mudanças que possam prejudicar seu poder", diz o analista Saad Djebbar.
"Mas, ao mesmo tempo, eles estão cientes de que precisam fazer algo. É por isso que são muito, muito lentos."
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