Do Valor
Cristiano Romero | De Brasília
25/10/2010
25/10/2010
A maior parte das peças-chave do governo de Luiz Inácio Lula da Silva são cotados a permanecer numa possível gestão Dilma Rousseff, mesmo que em cargos diferentes. Os partidos aliados devem manter a proporcionalidade que tiveram na atual administração, embora haja a expectativa de que o PSB, pelo seu desempenho eleitoral, ganhe maior estatura - hoje, a legenda possui apenas dois ministérios (Ciência e Tecnologia e Secretaria Especial dos Portos). Os principais postos ficarão com o PT, que possui hoje 17 dos 37 cargos com status de ministro. O PMDB, que hoje detém seis Pastas, além do Banco Central (BC), deve manter seu tamanho.
Os critérios que orientaram a formação do ministério de Lula devem se repetir na montagem da equipe de Dilma, consolidando a ideia de que o próximo governo será de continuidade, uma espécie de terceiro mandato consecutivo do PT. O núcleo decisório do governo continuará sendo essencialmente petista e o PMDB deve manter o controle da área de infraestrutura.
Assim como Lula fez, Dilma, se eleita, abrigará em seu ministério representantes dos principais setores econômicos do país - o agronegócio, a indústria e o setor financeiro. Manterá a tensão existente hoje entre um Banco Central ortodoxo e um Ministério da Fazenda desenvolvimentista, mas com uma diferença marcante em relação aos últimos dois anos do governo Lula: haverá controle de gastos públicos para o aumento efetivo do superávit primário, com o propósito de reduzir a dívida líquida para menos de 30% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2014 e favorecer a redução da taxa básica de juros (Selic) para níveis internacionais.
Também a exemplo de Lula, Dilma distribuirá os cargos para atender às várias correntes do PT e aos grupos regionais que comandam o PMDB, seu aliado mais forte, bem como os partidos que a apoiaram na eleição. Desta forma, a tendência é que as facções mais à esquerda do PT sigam no comando de temas como direitos humanos e reforma agrária. O PMDB, por sua vez, será atendido de acordo com a força de cada um dos seus caciques regionais - José Sarney, Renan Calheiros, Geddel Vieira, Jader Barbalho, Sérgio Cabral, Eduardo Cunha, Henrique Eduardo Alves, Romero Jucá e Eunício Oliveira.
No governo Lula, o PMDB controla o BC e seis ministérios - Agricultura, Defesa, Integração Nacional, Minas e Energia, Saúde e Comunicações. Suas lideranças consideram, no entanto, que apenas quatro, dos sete ministros, representam de fato a legenda. Nelson Jobim (Defesa), José Gomes Temporão (Saúde) e Henrique Meirelles (BC) estariam, na opinião desses pemedebistas, na cota pessoal do presidente Lula.
O questionamento dos líderes do PMDB vai se repetir com Dilma. Se for eleita, a candidata, segundo apurou o Valor, pretende manter Jobim na Defesa. Além disso, deve remanejar Meirelles para um ministério da área de infraestrutura. O mais provável é que ele assuma o Ministério dos Transportes, reestruturado e fortalecido - uma das ideias em estudo é unificar nessa Pasta áreas que hoje estão dispersas, como a de portos (hoje, atrelada ao Palácio do Planalto), a de infraestrutura aérea (atualmente, vinculada à Defesa) e a de transporte urbano (neste momento, subordinado ao Ministério das Cidades).
Meirelles terá o apoio, para o novo cargo, do deputado Michel Temer, presidente do PMDB e candidato a vice de Dilma. Os dois eram cotados para compor chapa com a candidata do PT, mas Meirelles, que tinha o apoio de Lula, evitou a disputa ao desistir da candidatura. Na ocasião, contemplou-se a possibilidade de ele assumir um cargo importante numa possível gestão Dilma.
A amigos, Meirelles confessou que teria interesse em tocar uma área que demande um projeto com "início, meio e fim". Como infraestrutura é hoje uma das áreas mais carentes do país e, por essa razão, estará no centro da agenda nos próximos anos, ele pode ser escalado para cuidar do Ministério dos Transportes, justamente a mais necessitada da área de infraestrutura. Permanecer no Banco Central é uma possibilidade, embora remota.
Para o lugar de Meirelles no BC, a tendência é que Dilma, se for eleita, opte por uma solução interna. Da atual diretoria, o mais cotado para assumir a presidência é o diretor de Normas, Alexandre Tombini. Não está descartada, entretanto, a nomeação de um economista renomado ou de um representante do mercado financeiro. A avaliação dos aliados de Dilma é que, com o avanço da estabilização, o BC terá um papel menos importante nas definições da política econômica.
Uma das dificuldades de Dilma está no Ministério da Fazenda. A candidata gostaria de nomear para o posto o presidente do BNDES, Luciano Coutinho. O problema é que o atual ministro, Guido Mantega, com quem ela tem boa relação, está interessado em permanecer no cargo. Pessoas ligadas diretamente à Dilma dizem que, se Lula interceder por Mantega, ela poderá se sentir constrangida a substituí-lo.
O plano da candidata para a economia prevê, além do equilíbrio fiscal, com a contenção dos gastos correntes abaixo da evolução do PIB, o aumento dos investimentos públicos e a criação de mecanismos para estimular o financiamento de longo prazo no país. A meta é diminuir os custos de produção para aumentar a competitividade das empresas que atuam no Brasil. Essa agenda se tornou ainda mais urgente por causa da chamada "guerra cambial", iniciada pelas maiores economias do mundo e cujo resultado tem sido a apreciação das moedas de países emergentes como o Brasil.
Dilma acredita que Coutinho, que foi seu professor na Unicamp, tem o perfil ideal para comandar a economia brasileira neste momento. A dúvida é o que fazer com Guido Mantega e como superar uma possível pressão do presidente Lula - quem conhece o presidente de perto acredita que ele vai se esforçar, caso Dilma seja eleita, para não influir diretamente em suas decisões.
A candidata tem hoje também forte vínculo com Nelson Barbosa, secretário de Política Econômica da Fazenda e principal formulador do programa Minha Casa, Minha Vida, a menina dos olhos de Dilma. Barbosa tem boa relação com Coutinho e poderá, caso este se torne ministro, permanecer na Fazenda, mas a tendência é que ganhe um cargo de maior relevância - uma possibilidade é a presidência do BNDES.
A acomodação dos partidos aliados enfrenta outros desafios. O PSB, por exemplo, saiu forte das eleições. Aumentou sua bancada na Câmara e no Senado, elegeu três governadores no primeiro turno, dois deles com mais de 80% dos votos (Eduardo Campos, em Pernambuco, e Renato Casagrande, no Espírito Santo), e tem chances de eleger outros três no segundo. O partido, naturalmente, quer ter mais espaço no governo.
Uma possível solução para Dilma pode estar na sua escolha para a Fazenda, afinal, Luciano Coutinho, embora não seja filiado, tem vínculos estreitos com o PSB de Eduardo Campos. Se virar ministro, passaria a ser um dos representantes da cota do partido no governo.
A candidata terá que superar dificuldades também no PT. Seu plano, caso seja eleita, é colocar Antônio Palocci na Casa Civil, que passaria a ter uma missão mais política. Palocci, que tem o apoio de Lula, estaria talhado para a função - é do PT, tem trânsito na oposição e é considerado um negociador habilidoso e discreto. Seu nome, no entanto, enfrenta a resistência de grupos do partido sob influência do ex-ministro José Dirceu.
Esses grupos defendem que Palocci seja nomeado para o Ministério da Saúde. A interlocutores próximos, Palocci atribui o movimento a desafetos. Para ele, só faria sentido ir para a Saúde como parte de um projeto político-eleitoral, com vistas, por exemplo, à eleição para o governo de São Paulo em 2014.
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