13 de dez. de 2011

A partícula de deus II

O que é o bóson de Higgs e como ele afeta a Física

Professora de Harvard explica o que é a “partícula de Deus” e o que muda na ciência a partir da descoberta de sua existência

The New York Times via IG

A busca pelo bóson de Higgs é um momento muito importante da história da Física. Sua existência, se comprovada, fundamenta um conceito importante da Física moderna, explicando porque as partículas elementares (como prótons, elétrons e nêutrons) têm massa. Mas, mesmo se os cientistas do Grande Colisor de Hádrons (conhecido pela sigla em inglês LHC) confirmarem que não foi possível encontrá-lo, para a ciência a notícia é ainda mais atordoante: significa que é preciso voltar aos livros e achar uma outra explicação para o fenômeno.Cientistas do CERN, onde fica o LHC, vão anunciar nesta terça-feira (13) novas descobertas sobre o bóson, mas ainda não se sabe se vão confirmar sua existência.
Lisa Randall, física teórica da Universidade de Harvard e autora de livros sobre física de partículas e cosmologia, responde às principais dúvidas de leigos sobre o bóson de Higgs:
NYT: O que é o bóson de Higgs e qual sua importância?
Lisa Randall:
 O nome Higgs se refere a pelo menos quatro coisas diferentes. Primeiro, existe o mecanismo de Higgs, que é o verdadeiro responsável pelas massas das partículas elementares. É um pouco difícil de explicar, mas entenda que seria algo como uma carga – não uma carga elétrica – que permeia o vácuo, onde não há partícula nenhuma.
Essas “cargas” são associados a um campo de HIggs. Quando as partículas passam por este campo, elas interagem com essas “cargas” e esta interação é que as faz agir como se tivessem massa. Partículas mais pesadas são mais afetadas, partículas mais leves, menos. Desta forma, o mecanismo de Higgs é essencial para as massas das partículas.
A partícula de Higgs, também chamada de bóson de Higgs, seria um vestígio do mecanismo de Higgs, uma prova real que ele aconteceu. É isso que os físicos estão procurando. Ao contrário do que se imagina, quem dá massa é o campo – não o bóson. Mas a descoberta de um bóson significaria que este mecanismo realmente existe e nos ajudaria a estabelecer como verdadeira a teoria que fundamenta o mecanismo de Higgs e o resto das teorias básicas da Física moderna.
E claro, Higgs também é o nome do físico que criou essa teoria, Peter Higgs, que junto com outros cientistas, será um possível nome ao Prêmio Nobel quando a partícula for descoberta.
Foto: Getty ImagesAmpliar
Simulação visual de um Bóson de Higgs: sons da "partícula de Deus"
NYT: Como os cientistas sabem o que procurar?

Lisa Randall:
 No modelo mais simples do mecanismo de Higgs, o bóson tem propriedades bem conhecidas e estabelecidas. Sabendo disso, podemos calcular quando o bóson deveria ser produzido e quando ele deveria se decompor. Ele interage especialmente bastante com partículas mais pesadas, por exemplo.
O que não sabemos, no entanto, é a massa do bóson. Dependendo da massa, ele se decompõe de maneiras diferentes, de acordo com a teoria. Por isso, os pesquisadores estão procurando em diferentes grandezas de massa e usando uma série de estratégias de busca.
NYT: O que sabemos até agora?
Lisa Randal
l: Já foram descartados vários valores de massa. O bóson de Higgs, se existir, tem que ter massas maiores que 114,4 gigaeletron-volts (GeV) , que são as unidades de massa usadas em partículas. Para comparação, os prótons, que são a base da matéria, têm um gigaeletron-volt, enquanto um elétron tem meio milhão de eletron-volts.
Baseadas nas experiências recentes do LHC, o bóson de Higgs também não pode ter massas entre 140 e 500 GeV. Isso significa que a faixa de 115 e 140 GeV é onde o bóson deve estar, e que deve ser o foco do anúncio de amanhã, embora a princípio ainda é possível que o bóson tenha ainda mais massa que isso.
É uma faixa de massa muito difícil de ser detectada, mesmo para a alta tecnologia do LHC. Imagino que eles tenham dados suficientes para não descartar a existência do bóson, mas ainda não o suficiente para afirmar com certeza que ele existe, sem os dados do ano que vem.
NYT: Faz diferença o valor da massa do bóson, para efeitos práticos?
Lisa Randall:
 Na verdade, não, pelo menos não para as propriedades da matéria. Desde que se confirme que o mecanismo de Higgs seja comprovado, as partículas que conhecemos terão as massas que elas experimentalmente têm.
Mas ninguém acredita que o Higgs seja a palavra final sobre o que fundamenta a teoria modelo da física de partículas, a teoria que descreve os elementos mais básicos da matéria e as forças pelas quais eles interagem. Mesmo que o bóson de Higgs seja descoberto, a questão sobre como as massas são como são continuará em aberto. Quando se começa a estudar física quântica e teoria da relatividade, por exemplo, outras teorias mostram que as coisas não deveriam ser como são.
Todos nós esperamos que existam alguns conceitos mais sofisticados do que o modelo padrão para explicar certos fenômenos. Algumas teorias servem apenas para certas massas. Entendendo melhor esse conceito, podemos aprofundar as teorias.
NYT: Se o LHC não encontrar o bóson, isso significa que ele fracassou?
Lisa Randall:
 A grande ironia é que se uma não descoberta do bóson significaria muito mais para a Física do que se ele for descoberto. Na verdade, seria espetacular, porque significaria que existe algo muito mais interessante do que uma simples partícula. Novas investigações poderiam revelar que a partícula que faz o papel do bóson tem interações além das que sabemos que devem existir para que as partículas tenham massa.
A outra possibilidade é que a resposta não seja uma partícula simples e fundamental como o bóson de Higgs que o LHC está procurando. Pode ser um elementos mais complexo ou fazer parte de um mecanismo mais sofisticado, e pode ser mais demorado encontrá-lo.
NYT: O que isso tem a ver com neutrinos – especificamente os que foram relatados recentemente como viajando a velocidades mais rápidas que a luz, pelo próprio CERN?
Lisa Randall:
 Neutrinos têm massas ínfimas. O mecanismo de Higgs deve ser parcialmente responsável por elas, também. Mas não seria nada que os encorajaria a viajar mais rápido que a luz - o que eu, particularmente, não acredito que façam.

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