Léo Rosa de Andrade na coluna Imperfeições no Notisul
Bibliotecas impressionam. Quem se encontra entre as estantes que guardam os livros de uma grande biblioteca, formando grandes seções sobre saberes diversos, fascina-se com a erudição que a humanidade acumulou ao mesmo tempo em que compreende que saberá pouco sobre tantas coisas. Quanto mais se sabe, mais fácil é saber e melhor se conjuga o aprendido. Mesmo assim, é impossível alcançar o que se oferta. Bibliotecas acumulam saber, entretanto, quem dá vida ao saber acumulado são os leitores, individualmente, na medida em que lêem e produzem novos ou desfrutam velhos conhecimentos. A biblioteca dorme e amanhece igual.
A vida própria da web
A web, à primeira vista, parece uma ilimitada biblioteca de livros não físicos, uma infinidade de estantes virtuais guardando livros que se consubstanciam quando acessados. Mas é muito mais do que isso. A web tem vida própria, ninguém a controla, nela se acrescenta conhecimento ao mesmo tempo em que se desinforma e se embaralham as coisas. A web nunca amanhece igual e ninguém está seguro de que os textos disponíveis sejam, de fato, informação séria ou fraude posta a circular. A informação virtual necessita de um acumulado de informação real, ou não fará muito sentido. Não é apesar disso, mas por isso mesmo, todavia, que é deslumbrante.
Poder
Essa vida própria que a web ganhou é, talvez, o acontecimento mais libertário de todos os tempos. É a primeira vez que a humanidade dispõe de uma fonte de conhecimento fora das licenças das autoridades, sejam as governamentais, sejam as familiares. Mesmo nos regimes ditatoriais dá-se um jeito, navega-se. Se livros podiam ter o transporte obstaculizado, ser queimados, bytes colocados em circulação são inalcançáveis pela censura. Os conteúdos on-line são dotados de ubiquidade. Podem ser acessados a baixíssimo custo em todos os lugares, e estão ao alcance de inúmeras, portáteis e velozes ferramentas de comunicação. Remetidos ou buscados, tornam-se criaturas escapadas do poder, inclusive do poder criador.
População vigia
Bem, ainda assim a internet é um meio. Pode muito, mas não pode mais do que o fim que lhe é dado. Manuel Castells, Universitat Oberta de Catalunya: “O poder sempre esteve baseado no controle e, às vezes, na manipulação da informação. O grau de autonomia das pessoas para se comunicar, informar e organizar suas próprias redes de sociabilidade é muito mais potente com a internet. Ela é a construção da autonomia da sociedade civil. Os governos sempre tiveram horror a isso. Não podem controlar. A única maneira é desconectá-la totalmente, um preço que nenhum país pode pagar. Está relativamente nivelado o espaço da comunicação em que se enfrentam interesses distintos. Os poderosos vigiavam os demais porque tinham os meios e a capacidade de fazê-lo. Agora as pessoas também podem vigiar os poderosos.”.
Movimentos autônomos
Mas, “as mudanças fundamentais são as que se produzem na mente: quando as pessoas mudam sua forma de pensar e, portanto, de atuar. Para que se manifestem fenômenos de utilização da rede nas mudanças de consciência e de informação, é preciso haver rede em condições e interesse num sistema político. A renovação do sistema político exige que as pessoas queiram uma mudança. A internet serve para amplificar e articular os movimentos autônomos da sociedade. Ora, se essa sociedade não quer mudar, a internet servirá para que não mude” (FSP, 21set10 - Editado). Esse meio extraordinário é sucesso entre nós, sobretudo para um fim: fofoca da vida pessoal. Para o bem e para o mal, seguiremos tal e qual. Que tal?
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